terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Duas malas de saudades

Os sentimentos que me tomam vem carregados de um peso tácito que me aligeira os pêlos desavisados e desprovidos de entendimento e ânsia de respostas.
Pesam dentro da mala na qual me fiz.
Pesam ao tentar colocar sobre o monte de camisas de Álvaro Campos, seu sorriso largo, seu gemido mudo, seu orgasmo que é meu.
Meu não no sentido de tê-lo eu suscitado em você, mas sim na brevidade do gozo não ejaculado que seu olhar hedonista me traz a pele.
Pesa dentro de mim isso, e aquilo que foge a minha explicação.
Pesa, toma forma, saudade, amor, raiva, desejo, tudo se materializa em mim, ocupando mais espaço que a refeição que fiz na noite passada.
Você me ocupa, toma espaço dentro dessa mala mal arruma que sou, e quando vai, na pressa das mãos que vestem a roupa, na pressa das mãos de quem escreve tchau, na pressa das mãos de quem solta um beijo que nunca chega, você acaba deixando um buraco entre as camisas e os poemas de Pessoa.
Você pesa em mim, como pesa os olhos na noite de vigília, como pesa a voz de quem vai dizer que ama, como pesa o não-espada que crava no meu peito nu quando fica muda.
O que sinto me pesa, me lesa o juízo, tira do que sou o sumo fundamental pra invenção da pólvora.
O amor pesa em mim, como pesa o pavio que você deixou aceso em meu paiol, como pesa o copo de conhaque que me faz leve, como pesa a gilete que corta minha carne frouxa antes da leveza da dor.
E eu me fiz mala, mal arrumada, as vésperas de uma viagem que nunca chega, a espera das mãos que vão me guiar por aí...
Com tudo que vi, com tudo que toquei, com tudo que fui.
Sem arrependimentos vagos, sem lembranças que eu não possa reviver.
Me fiz mala sim, de uma viagem que começa em mim e só tem fim em você.

Douglas Alves

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